quarta-feira, 14 de maio de 2014

JESUS: a Videira Verdadeira

A VIDEIRA VERDADEIRA

Fonte: Google.

O Evangelho segundo São João é o Evangelho do amor, da comunidade, do testemunho apostólico. O olhar eclesiológico da perícope (15,1-17) está precedido pelo aprofundamento cristológico. Uma comunidade não subsiste se não estiver fundamentada em Cristo-videira. João alerta sua comunidade a permanecer, a ficar com o Senhor, pois Cristo está no Pai e o Pai está com o Filho. Permanecer no Filho é permanecer na Trindade.
“O olhar fixo de Jesus ultrapassa o tempo das separações, para aplicar-se diretamente à futura existência das comunidades dos discípulos e fortificá-la”[1]. Isto que é prometido em 14,20 (Nesse dia compreendereis que estou em meu Pai e vós em mim e eu em vós) é pressuposto para 15,4 “Permanecei em mim como eu em vós.” Depois os convida para sair, Jesus prossegue com a imagem da vinha e dos ramos. No AT, a videira representa Israel (Sl 80,9-17; Os 10,1; Is 5,1-7; 27,2-6; Jr 2,21; Ez 15,1-8; Eclo 24,17-20), neste trecho de (Jo 15,1-17), é Jesus intimamente unido aos ramos que são os discípulos (cf a imagem da porta e do Pastor do capítulo 10). “A videira ou vinha era de fato símbolo de Israel como povo de Deus.”[2] Na perícope, Jesus quer fortificar os discípulos na missão com plena intimidade com Ele mesmo e com o Pai. Para que o discipulado dê frutos é preciso viver em comunidade e como comunidade unida ao Tronco, ou seja, ao Pai. Com isso, Pai e Filho se configuram na unidade e fundamento da árvore.
É possível fazer uma analogia entre a imagem da videira e àquela paulina do “corpo”. Aqui a cristologia se desenvolve em precedência do discurso da eclesiologia. Para estruturar uma Igreja é necessário antes o Cabeça. O discípulo, membro da Igreja, deve permanecer unido a Jesus-Capo, do mesmo modo que Jesus é com o Pai. Só assim poderá dar bons frutos e continuar a obra de Jesus: aquela de manifestar ao mundo o amor do Pai. O amor eclesial manifesta ao mundo o amor Trinitário no qual o discípulo é chamado a viver. Este, em síntese, é o pensamento de João.
Para João, Jesus não é uma videira qualquer, mas a única Verdadeira, que o Pai plantou no meio dos homens. O Pai, portanto, é a fonte, Jesus o revelador do seu amor, e os discípulos entram como aqueles que darão continuidade da sua obra. A comunidade participa do mesmo tronco da videira, que é Jesus. O Pai é a fonte das seivas, que por meio de Jesus, chega à comunidade dos discípulos. Esta, para produzir fruto deve permanecer em Jesus. Serão os frutos sinais de unidade e pertença da comunidade à videira.
A união dos ramos à videira não pode ser somente aparente, mas frutífera, pois os ramos que não “produz fruto, Ele – O Pai – o corta” (v. 2). A poda é diferente, o Pai quando poda, faz para que o fiel dê bons frutos. Na vida do discípulo, é preciso fazer muitas podas para que aquilo que é velho seja jogado fora.
De fato, o que não presta deve ser jogado fora. O que deve conservar-se é a palavra (v. 3) ou “as palavras” (v. 7), ou o “permaneci em mim” (v. 4) no coração do discípulo, a fim de que sejam purificados e produzam frutos. Se não tiver esta comunhão entre a comunidade e o mestre, nada podem fazer: “sem mim, nada podeis fazer” (v.5). Estar unido a Jesus-Videira, numa “imanência recíproca” possibilitará a comunidade dos discípulos pedirem o que quiser e será concedido por parte do Pai (v.7). O Pai é glorificado não somente pelo testemunho do Filho, mas pelos frutos visíveis dos verdadeiros discípulos de Jesus. (v.8).
Da alegoria (15,1-8), Jesus passa agora a falar das realidades do amor (15,9ss): “o frutificar-se revela-se no mais profundo do amor”[3]. Também é possível dizer que “o fruto é a realidade do homem novo”.[4] Jesus convida os discípulos a permanecer no amor dele e do Pai. O amor que o Pai tem para com Jesus é a fonte e o arquétipo do amor de Jesus para os discípulos: “assim como o Pai me amou também eu vos amei” (v. 9). Jesus continua ensinando os seus discípulos dizendo que a maior prova de amor será a observância dos mandamentos; Cristo é o modelo: Ele guarda os mandamentos do Pai, assim também a comunidade eclesial deve guardar os mandamentos de Jesus. Os mandamentos são aquelas leis divinas pelas quais a comunidade deve viver. E o mandamento de que Jesus fala (v.12) é o amor fraterno; este amor fraterno, na comunidade, se reflete na acolhida, a escuta, na caridade para com os mais necessitados que fazem parte dos ramos da vinha.
“O ato de permanecer no amor de Jesus produz nos discípulos frutos de alegria (cf Gal 5,22 onde há amor sucede a alegria). Uma alegria que tem duas dimensões: cristológica, porque é a alegria dada por Cristo ressuscitado e escatológica, porque é uma alegria plena, completa, perfeita.” Quando o amor fraternal é vivido, há possibilidade de doar até a própria vida. Jesus mostra que “doar a vida” (v.13) pelos amigos é possível. Isso será visível na cruz; na cruz, Jesus morre pelos discípulos, pela Igreja e por toda a humanidade. O sinal de amor de Cristo para com os discípulos é a cruz, e o sinal do amor da Igreja para com Jesus é a prática dos mandamentos, especificamente neste texto: amar uns aos outros. Jesus alerta logo aos seus discípulos: só são “meus amigos se praticais o que vos mando”(v.14). Se os ramos não obedecerem aos mandamentos do Tronco, não podem permanecer ligados à videira. Mais uma vez Cristo volta a insistir com seus discípulos sobre a obediência aos mandamentos (cf. 14,15; 15,10). O Evangelista que evidenciar que a obediência é a base verdadeira e vital da comunidade, ao mesmo tempo em que as obras são sinais infalíveis da fé. João alerta: quem diz, na comunidade de pertencer ao Senhor, mas vive em pecado e do pecado não quer sair, negligencia os mandamentos de Cristo, e está no caminho largo que leva a perdição.
O ato de obedecer e praticar os mandamentos darão aos discípulos uma nova categoria no discipulado de Jesus: amigos. O evangelista evidencia que pertencer ao Senhor agora (15,15) é mais que ser servo, é ser amigo! No seguimento de Jesus, os discípulos eram considerados como servos (doulos) (cf. Jo 12,26; 13,13-16; Mt 10,24-25) e continuarão a sê-los talis quais. Mas agora o Senhor declara sobre outro aspecto que, pela confiança e amor neles depositados, são chamados a um grau superior, de amigos. Jesus quer aproximar mais os discípulos de si chamando-os de amigos. “A comunicação entre amigos já não é a de mestre a discípulo; já terminou o aprendizado, pois Jesus já comunicou tudo (...) o tipo de relação que Jesus tem com os discípulos é a que Jesus tem com o Pai (cf. 10,14s; 14, 10-11.20; 15,9s)”[5].  “O tema da amizade é muito importante, seja no mundo greco-romano, seja no judaico. No judaísmo são amigos de Deus Abraão (Is 41,8; 2Cr 20,7; Tg 2,23), Moisés (Ex 33,11)” e aqueles capazes de penetrar os mistérios de Deus, como os profetas. Jesus, ao elevar os discípulos a categoria de amigos, está lhes dando a possibilidade de uma “vida de santidade e intimidade com Deus, capaz de penetrar no mais profundo conhecimento de suas exigências ou de seus mistérios ao passo de torná-los seus interpretes autorizados, capazes de iluminar os outros homens”. Este versículo dá um novo sentido aos membros da comunidade joanina e, hoje, a toda a Igreja: a amizade que deve haver entre os discípulos e o Mestre. A importância da amizade é tanta que o Filho deu aos amigos aquilo que até então estava entre Ele mesmo e o Pai: “tudo que ouvi de meu Pai vos dei a conhecer”. Jesus é fiel e obediente ao Pai, pois o que Jesus passa aos discípulos é vontade própria do Pai. Cristo é a Ponte e o conteúdo por onde passa o plano de salvação. Ele é a ponte porque o conteúdo vem do Pai, mas Ele é também o conteúdo salvífico, ele é a salvação encarnada. A mesma comunhão que existe na trindade, é reflexo da comunhão que deve existir entre os membros da comunidade.
O discípulo não pode esquecer-se quanto ao objetivo da missão: permanecendo sempre com Jesus, ir para missão e dar frutos (v.16). O discípulo não pode vangloriar-se dessa amizade, pois Jesus exorta: “não foste vós que me escolhestes, mas fui eu que vos escolhi”. Parece uma exortação muito dura; de fato, Brown vê nestas palavras um aviso para não se orgulhar depois das grandes coisas que Jesus lhes tinha anunciado como revelação do Pai. Os discípulos tem uma missão muito importante, não podem vacilar neste projeto salvífico. É Jesus quem escolhe aquele que Ele quer (Marcos 3,13), a escolha já é uma graça, um dom: participar da vida eterna e da eterna comunhão trinitária. Os discípulos são enviados, os frutos devem aparecer, e o testemunho deve permanecer, testemunho de vida fraternal. Só assim é que qualquer coisa que for pedido ao Pai em nome de Jesus lhes será concedido. Os versículos 16 e 17 é a conclusão da eclesia formada e querida por Jesus e vivenciada na comunidade joanina. A Igreja é constituída por Cristo, Ele assim o quis (Mt 28,19-20), “eu que vos escolhi e vos designei para irdes”. Aqui é possível dizer que antes da eclesiologia vem a cristologia, sendo a base da eclesia o mandato: “amai-vos uns aos outros” (v.17).
Os discípulos, como comunidade fundamentada no amor, devem enfrentar o mundo com uma nova proposta evangélica: o Reino de Deus. Este Reino será constituído pelo novo povo de Deus que farão parte deste caminho salvífico. A missão dos discípulos, colocada por João nesta perícope analisada, será agregar pela força do Espírito Santo todos os homens e mulheres debilitados pelo pecado. E a primeira forma de anúncio é o testemunho comunitário.



 
Fonte: Google.






[1] Schnackenburg, Rudolf.  Il vangelo di Giovanni. Brescia: Paideia, 2000.
[2] MATEOS, Juan, S. J. O Evangelho de João: análise linguística e comentário exegético. 2. ed. São Paulo: Paulus, 1999.
[3] Schnackenburg, 2000.
[4] MATEOS, 1999.
[5] MATEOS, 1999. 



REFERÊNCIAS

BÍBLIA DE JERUSALÉM. Nova edição, revista e ampliada. Português. São Paulo: Paulus, 2004.
MATEOS, Juan, S. J. O Evangelho de João: análise linguística e comentário exegético. 2. ed. São Paulo: Paulus, 1999.
OLIVEIRA, C. J. Pinto de. O Evangelho da unidade e do amor. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1963. 
SCHNACKENBURG, Rudolf.  Il vangelo di GiovanniBrescia: Paideia, 2000.

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