quinta-feira, 24 de abril de 2014

HOMILIA DE DOM OTTORINO NA MISSA DOS SANTOS ÓLEOS - A COMUNHÃO SACERDOTAL

MISSA DOS SANTOS ÓLEOS – 15.04.14



1. A celebração desta Missa dos Santos Óleos nos ajuda a compreender a dimensão sacerdotal do povo de Deus: o sacerdócio comum dos fiéis em força do Batismo e o sacerdócio dos ministros ordenados; este não exclui o outro, mas o enriquece.
A vocação e a missão dos leigos são tão importantes para a vitalidade das nossas Comunidades, seja pelo esforço de comunicar a fé às crianças e jovens, seja pela animação das pastorais e pelo anúncio do Evangelho, seja pela presença nas estruturas e dinamismos da sociedade, com especial atenção às instituições de caridade.
Aos sacerdotes, ministros ordenados, cabem estimular e apoiar, em força da graça própria da ordenação, esta riqueza e pluralidade apostólica dos fiéis. E estes, os fiéis, precisam necessariamente da presença dos ministros ordenados, porque, pelo sacramento da Ordem, encarnam a pessoa e a missão de Jesus Cristo.
O caráter indispensável do ministério sacerdotal convida-nos a um compromisso sério e decidido na pastoral das vocações sacerdotais, porque é de suma importância para a vida da Igreja e do mundo.
Devo, neste momento, lamentar a escassez das vocações sacerdotais em nossa Diocese: não porque Deus não chama, mas porque nós não rezamos insistentemente ao Senhor da messe, porque não trabalhamos com entusiasmo neste campo tão delicado, porque não testemunhamos a alegria de ser sacerdotes, porque não dirigimos o convite aos nossos jovens e porque, estes também, se fazem de surdos aos apelos de Deus e gostam mais das propostas do mundo.
Haja, em nossa Diocese, uma corrente de orações, como um cerco de Jericó ao redor dos jovens, para derrubar os muros da superficialidade, dos prazeres humanos, da liberdade individual, do egoísmo e do medo: quase por encanto, veremos surgir novas vocações, generosas e corajosas!
2. Mas, nesta celebração, nós podemos entender, pela consagração dos santos óleos, a abundância sacramental na Igreja pela ação  dos ministros ordenados; esta Missa, dita da unidade, porque reúne os presbíteros ao redor do Bispo, mostra a riqueza sacramental que é, principalmente, dom de Deus e, ao mesmo tempo, compromisso pastoral nosso, a partir da comunhão de amor que brota do mistério trinitário.
O Papa João Paulo II, proximamente santo, dizia: “A identidade sacerdotal, como toda e qualquer identidade cristã, encontra na SS. Trindade a sua própria fonte” (PDV,12).
Esta provocação que vem do Santo Papa, leva-me, mais uma vez, a tocar no tema da comunhão presbiteral e na caridade fraterna, tão almejada pelo Senhor Jesus na longa oração sacerdotal, antes da Paixão.
Todos os anos, na celebração da Missa crismal, ofereci estímulos e pedi um compromisso sério na construção desta comunhão, mas ainda estamos longe: temos que admitir esta falha.
Não basta denunciar a falta de comunhão e caridade fraterna; precisa agir, começar com gestos concretos de amor, com humildade e perseverança, senão é pura atitude fingida, é álibi ao nosso agir.
Sinto-me na mesma situação de Jesus diante de Jerusalém: “Jerusalém, Jerusalém, que matas os profetas e apedrejas os que te foram enviados, quantas vezes quis reunir teus filhos como a galinha recolhe seus pintainhos debaixo das asas, mas não quisestes!” (Lc 13,34).
O meu coração de pai e irmão está ferido e machucado, sofre do mesmo jeito, porque vejo os entrelaços que impedem o crescimento, percebo as barreiras que freiam minha ação, mas não renuncio a indicar os comportamentos que não favorecem e destroem a comunhão: quem não assume este compromisso vivendo às margens da comunidade sacerdotal, quem semeia cizânia, espalhando suspeitas e até calúnias, este está aliado com o diabo, que é a raiz de todos os males; quem não perdoa, quem ignora o seu irmão, quem tem vida ambígua é indigno do ministério sacerdotal.
Jesus sabia quanto seria difícil viver a comunhão e rezava ao Pai “para que sejam um como nós”, mas ao mesmo tempo pedia-lhe de guardá-los do Maligno “para que sejam perfeitos na unidade  e para que o mundo creia”; somente a vida íntima com a SS. Trindade pode garantir a comunhão.
3. A celebração desta noite é marcada por uma forte espiritualidade sacerdotal, porque foi na Primeira Páscoa, a Páscoa definitiva, que Jesus Cristo exerceu o seu múnus sacerdotal, substituindo-se ao cordeiro pascal: Ele se ofereceu como verdadeiro Cordeiro; foi uma Páscoa eterna, no sentido que nunca irá se esgotar, porque naquela Primeira do tempo definitivo, Jesus incumbiu aos 12 Apóstolos de dar continuidade para sempre: “fazei isto em memória de mim”.
É a partir da Eucaristia que poderá desabrochar e crescer a nossa espiritualidade sacerdotal. Indico alguns aspectos desta espiritualidade.
Antes de mais nada, o Sacerdote age na Pessoa de Jesus Cristo que está presente nele. Isso exige, por parte do Sacerdote, uma semelhança sempre mais profunda com Jesus que está nele, a fim de ser, como Jesus: caminho, verdade e vida. Podemos dizer isso com serenidade?
Em segundo lugar, nós sabemos que a santidade é a qualidade específica de Jesus: ela é bondade, é amor, é beleza interior, é pura luz. Estamos, pelo menos, tentando o caminho da santidade, revestindo-nos destas qualidades? Como Sacerdotes, temos a consciência de ser ministros de santificação, pontes de encontro entre Deus e os homens?
O Papa Francisco, comentando ontem aos Seminaristas maiores a Palavra de Ezequiel “Ai dos pastores que apascentam a si mesmos”, dizia: “Vós não vos estais preparando para exercer uma profissão, para vos tornardes funcionários de uma empresa ou de um organismo burocrático. Cuidado, estais atentos a não cair nisso! Trata-se de se tornarem Pastores à imagem do Bom Pastor. Quem não se sentir disposto a seguir este caminho, com esta atitude e orientação, tenha coragem de procurar outra estrada”....;
Lendo nestes dias um texto de Madre Trinidad de la Santa Iglésia, sobre a mesma passagem de Ezequiel, ela comentava: “Há sacerdotes sem viverem em comunhão com Deus, sem o conhecerem, sem saberem bem os critérios divinos e, portanto, sem assimilarem a vida da Igreja, usurpando aos leigos a formosa responsabilidade que Deus lhes confiou no seio da Igreja”: palavras gravíssimas! A espiritualidade sacerdotal é exatamente o contrário.
Outro elemento da espiritualidade sacerdotal é: ser apaixonados, enamorados por Deus. Estamos vivendo num tempo difícil, que obscurece o que é sagrado; não podemos perder o enamoramento com Deus, pelo contrário, temos que regenerá-lo interiormente a cada dia, se não quisermos que outros amores tomem conta de nós. A vida do Padre, sem a paixão por Deus, é pesada demais e poderia se tornar insuportável. Mas, vejam bem, a solução não está no abandono, mas no retorno à fonte da alegria, ao amor de Deus, que basta ao coração, como lembra Santa Tereza.
Este é o grande mistério que nos envolve, que nos preenche e que tem como objetivo a renovação do mundo, conforme o projeto de Deus.

Poderia dizer muitas coisas ainda sobre a nossa espiritualidade, mas paro por aqui. Confesso que a preparação desta homilia me causou muito sofrimento, com sentimentos de frustração, de derrota, de culpa. Onde está a comunhão do meu presbitério? Onde está o mal que impede a comunhão? Levantei os olhos ao Crucificado, refleti sobre o lema do meu brasão “A cruz de Cristo em nossos corações”; entendi: é pela paixão e morte que se chega à Ressurreição. Retomo, portanto, com humildade o meu caminho, consciente das minhas limitações e fraquezas, mas firme certeza que o Senhor está ao meu lado, está ao vosso lado; está em vosso meio, meus irmãos e minhas irmãs! Rezai por nós.

Nenhum comentário:

Postar um comentário